LUSA interview

Nicolaas Vergunst reescreve assassínio de Dom Francisco de Almeida com sonhos e profecias.

Nova Iorque, 30 outubro—recorrendo a sonhos, profecias de uma vidente e outras fontes não tradicionais em obras de raiz histórica, o escritor sul-africano Nicolaas Vergunst reconta em Nó de Pedra (Knot of Stone) o assassínio de Dom Francisco de Almeida no século XVI.

Dom Francisco Dalmeyda, Knot of Stone, Courtesy British Library“O massacre do primeiro vice-rei da Índia Portuguesa e dos seus compatriotas, invariavelmente apresentado como um conflito racial (apartheid), parece ser um caso mais intrigante envolvendo conspiradores, cabalistas católicos, rivalidades entre ordens militares e, claro, ciúmes entre famílias da Corte”, afirmou o autor à Lusa.

“O livro começa com uma pergunta: É se não tiver sido simplesmente uma emboscada dos nativos locais, mas um motim ou um assassínio?”, adianta. Depois do Reino Unido, em setembro, Knot of Stone (Nó de Pedra) é agora lançado nos Estados Unidos pela Arena Books e, em março de 2012, deverá ser oficialmente apresentado na África do Sul.

O tema central é o assassínio do vice-rei da Índia Portuguesa D. Francisco de Almeida que, juntamente com 60 portugueses, foi morto onde é hoje a cidade do Cabo, por uma tribo local, naquela que é considerada a primeira batalha entre brancos e negros na história sul-africana.

“Raramente encontramos documentos históricos que provem um assassínio, não de um que aconteceu há 500 anos, e certamente não de um que aconteceu antes dos arquivos históricos de Lisboa terem ardido”, disse o escritor, a propósito da escolha da forma do romance em vez de um livro académico sobre o tema.

“Vejam-se as mortes de Dag Hammarskjold, secretário geral da ONU, ou de presidente JFK dos Estados Unidos há apenas 50 anos—em ambos os casos, temos fotos, gravações audio e vídeo e, mesmo assim, nunca encontramos provas conclusivas de assassínio por detrás das suas tragédias. Só um pistoleiro solitário ou problemas técnicos”, adiantou.

Residente em Estrasburgo, França, Vergunst dedicou cinco anos até chegar ao atual livro, mas o interesse sobre a história começou há mais de 25 anos, quando um padre lhe falou da teoria do assassínio. Agora, pretende ver a obra traduzida para português, e diz ter material para voltar ao tema mais tarde. Além do texto, Vergunst assina o grafismo e desenha as gravuras que ilustram o livro, uma vez que “visualiza cenários antes de os escrever”. Nó de Pedra, afirma, é “acima de tudo um trabalho de deteção histórica que se abre a diferentes géneros literários em vez de ser ‘faction’, disse, aludindo à síntese de factos (facts) e ficção (fiction)”.

“Procurei uma sinergia entre a experiência registada, ou factos, e a imaginação, fição. No fim de contas, não precisamos todos de dar sentido à vida, procurar um significado para o mundo em que vivemos?”, questiona o autor. O livro passa-se nos dias de hoje, entre a África do Sul e Portugal, e aborda as consequências do assassínio na África do Sul, que poderia ter sido “um segundo Brasil”, se tivesse sido colonizado por Portugal.

Como a “maioria dos documentos” sobre o episódio foram destruídos na tragédia de 1755, em Lisboa, foi preciso ir buscar “informação fresca a fontes não convencionais, como testemunhos orais, sonhos e profecias… Os meus dois principais informadores nunca publicaram o material usado aqui para resconstruir os acontecimentos, um sendo um professor europeu de História que sonhou com o assassínio, outra, de forma bastante separada, uma vidente africana que ‘viu’ o que aconteceu”, afirma o escritor. Embora o sucessor do vice-rei, Afonso de Albuquerque, que foi preso à chegada à Índia, tivesse “o motivo, meios e oportunidade” para ordenar o assassínio, Vergunst vira-se mais para o “dedo” de “fações da Igreja Católica antagonistas à sua missão” no Cabo.

Paulo Dias Figueiredo (LUSA)

 

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